Kmac Reggae Festival

Decorreu no passado dia 23, nas instalações da Voz do Operário em Lisboa, o KMAC reggae festival. Decorreu, pelo menos em parte, devido a uns contratempos inesperados, mas já lá iremos. Quanto ao festival, organizado pela Avó Lembra Produções com o apoio da Casa Rastafari de Enoque, prometia ser um dos melhores até agora realizados, dado o enorme leque de bandas, toasters e selectors portugueses que o cartaz apresentava. 

Ainda que organizado, mais ou menos, em cima da hora, o Kmac reggae festival acabou por surgir como uma excelente alternativa ao anunciado concerto que agrupava duas estrelas do reggae mundial, Horace Andy e Ijahman Levi, préviamente marcado para este mesmo fim de semana, mas entretanto adiado... A verdade é que todo o massive português, já habituado a estas noites do reggae na Voz do Operário, compareceu em massa, criando desde logo um ambiente de harmonia total para o espectáculo que se seguia. Marcado para começar por volta das 22.00 horas, os problemas começaram com um longo atraso na abertura das portas e foi já só por volta da 1.15 que subiu ao palco a primeira banda da noite. E de que melhor maneira de começar que com os One Love Family ?

A banda de Vila Nova de Poines, já muito conhecida entre o massive português, mas fazendo a sua estreia aqui no palco da Voz, rapidamente espalhou as suas vibrações de paz e amor e pôs toda a gente a dançar ao som de temas como “Educação” ou “Remember Them” que demonstram bem a versatilidade do brother Jahlu a cantar, quer em português quer em inglês. Provavelmente, e como já li em críticas feitas acerca dos One Love Family, uma guitarra solo traria ao seu som “roots” uma maior profundidade, mas na verdade o talento, a atitude e o sentimento estão todos lá na sua mensagem de paz... Como disse certa vez Bob Marley “O reggae não é para se ouvir é para se sentir. Quem não o sente, não o conhece.” Infelizmente, e dada a hora tardia, o converto pecou por ser curto (o que de resto, aconteceu com todos os que conseguiram actuar...) mas ficou mais uma vez provado que os One Love Family são de facto uma das bandas mais acarinhadas pelo massive português. O espectáculo continuou logo de seguida com o selecta Toy a animar o ambiente, enquanto que no palco, a Fankambareggae Band preparava-se para ser a banda de apoio duas actuações que se seguiam, Lopez Cortez e Man Cris. Com a actuação de cada um a ficar-se pelo quarto de hora, apresentaram um roots reggae suave, por vezes a roçar pelo ragga, agradando à maioria dos presentes, para mim que não conhecia qualquer um dos dois, foram uma agradável surpresa.

Foi então a vez do já habitual selecta Lexo tomar conta do som. Este membro do recentemente formado Dubadelic soundsystem, teve a missão de manter todos a dançar até à 4ª actuação da noite, os Skazoomba. Este conjunto, oriundo de Vila Franca de Xira, que tem a sua musicalidade mais direccionada para o ska, surgiu aqui com um som ska/reggae, dado o ambiente em que estavam a tocar, não deixando de divagar por outros ritmos sonoros como o hip-hop. No entanto, a sua mensagem estava lá sempre presente, não só de harmonia e união, mas também de intervenção, relembrando a todos os presentes os irmãos que são constantemente injustiçados e assassinados.

Aqueles que resistiam ao calor intenso que se fazia sentir na sala e à nuvem da omnipresente ganja que harmonizava o ambiente, tiveram a oportunidade de ver o selecta Lexo actuar novamente, mas por pouco tempo, já que os Like the Man Said preparavam-se para começar um concerto esperado por muitos dos presentes. Com uma excelente actuação há cerca de um mês, neste mesmo local, os Like the Man Said tinham deixado boas indicações, e voltaram para tocar o seu reggae puro e agressivo, donde são de destacar, na minha opinião, os ritmos produzidos pela bateria e a poderoso e cativante voz do seu vocalista. Uma banda que começa a captar as atenções do público e a ter em conta para o futuro do reggae português.

Quando os Like the Man Said começavam a pôr todos em extase, eis que surge a Polícia de segurança pública ( os “peace officers” tão bem ilustrados pelo grande Jimmy Cliff) e acabaram com a festa, alegando que se estava a fazer muito “barulho”. Os Like the Man Said abandonaram o palco, e a sala lá se foi esvaziando. Estamos aqui perante duas situações a que não podemos ficar indiferentes: por um lado, o desrespeito com que nos trataram ao estragar uma festa onde as vibrações positivas estavam a encarregar-se de que tudo corresse pelo melhor (como aliás sempre acontece); por outro lado, o respeito que toda a comunidade reggae e rastafari demonstrou face à situação, abandonando o local calmamente, ainda que com alguma frustração e sentimento de injustiça, (ainda se ouviam alguns irmãos, aqui e ali, a gritarem “Babilónia, Babilónia!”). Restou-me ir embora esperando que o concerto dos Kussondulola, que iria ocorrer no dia seguinte, compensasse por aquele que não tiveram oportunidade de proporcionar nessa noite.

Artigo e fotografias por Ricardo Jorge Duarte.